- 31/03/2008 |
- Marcelo Perrone
- Zero Hora
Hollywood acredita que uma grande inovação tecnológica fará da sala de cinema outra vez um lugar de emoções fortes e únicas. O que se busca é aquela mesma sensação de espanto que os irmãos Lumière arrancaram da platéia em 1895, quando espectadores se jogavam ao chão apavorados para se proteger de um trem que brotava da tela no nascimento do cinema.
A novidade é o cinema tridimensional, que literalmente coloca o espectador dentro do filme. Novidade, o 3D? Não. Mas o que se vê agora é bem diferente do que se conheceu 50 anos atrás, com óculos de papelão, imagens com fantasmas e dor de cabeça. Os estúdios que vêm apostando no novo sistema desde 2005 tiveram resultados animadores em 2007, projetam grandes sucessos para 2008 e a decolagem definitiva em 2009. Mesmo nos EUA, a transição é lenta - apenas 12% das 38,7 mil salas estão digitalizadas, exigência para instalar o 3D, já presente em 900 delas. No Brasil, somente cinco das 2,1 mil salas são equipadas com projeção 3D.
Filmes baixados ilegalmente da internet e equipamentos domésticos que reproduzem na sala de casa imagem e som espetaculares são alguns dos novos inimigos de Hollywood. Entre os altos e baixos do mercado, os grandes estúdios mantêm o lucro em dia, mas sentiram necessidade de uma reviravolta urgente no negócio. Como já fez em outras ocasiões diante do alerta vermelho (veja quadro abaixo), a milionária indústria acredita ter no 3D uma valiosa carta na manga.
- É nada mais nada menos que a maior inovação que ocorreu em nosso negócio desde a chegada da cor, há 70 anos - disse Jeffrey Katzenberg, da DreamWorks, um dos mais poderosos executivos de Hollywood.
Katzenberg garantiu isso há poucas semanas, em Las Vegas, durante o ShoWest, a maior convenção da indústria cinematográfica. O evento teve como pauta a transição para o sistema digital. Mas embasbacados com a exibição em primeira mão da aventura em 3D Viagem ao Centro da Terra, produtores, distribuidores e exibidores apostam que 2009 será o ano da virada (leia ao lado).
O Brasil já tem duas salas digitais em São Paulo, duas no Rio e uma em Florianópolis. O grupo Cinemark opera quatro dessa salas, e o presidente da rede no Brasil, Marcelo Bertini, analisa com cautela a expansão local do 3D - cada sala, só em equipamento, tem um custo de R$ 420 mil.
- O primeiro passo é avançar na migração da projeção em filme para a digital, mas o espectador leigo não vai notar diferença - explica Bertini. O 3D é esse elemento diferencial. Mas o alto custo ainda deixa negócio inviável, mesmo com o ingresso mais caro (de R$ 13 a R$ 18).
Mesmo sob ponto de vista conservador, Bertini prevê uma expansão para os próximos cinco anos. Umas das novas salas digitais do Cinemark, especula o mercado exibidor, pode ser instalada no BarraShoppingSul , em construção na Zona Sul de Porto Alegre. Ele não confirma, nem desmente.
Principais marcos tecnológicos do cinema
1895 - Os irmãos franceses Auguste e Louis Lumière inventam o cinematógrafo e realizam a primeira sessão de cinema, em 28 de dezembro de 1895, em um café de Paris. O sucesso não é imediato, mas logo começam a se formar filas que somam até 2 mil pessoas por dia. O programa de 20 minutos apresentava 10 filmetes. Chegada de um Trem à Estação, com apenas 50 de segundos de duração, inaugura a era das grande emoções no cinema: imaginando ser real o trem que crescia na tela, o público protege-se atrás das cadeiras.
1927 - O cinema fala: a Warner lança com pompa a técnica que vinha sendo testada desde o ano anterior. O Cantor de Jazz deixou a platéia de queixo caído com músicas cantadas e diálogos. A revolução foi tamanha que exigiu dos atores novos métodos de interpretação e boa voz, aposentando alguns galãs.
1929 - George Eastman cria a técnica do filme em cores. Quem logo adere é Walt Disney em seus desenhos de curta-metragem. O primeiro longa em Technicolor aparece em 1935: Vaidade e Beleza. O sistema atinge seu apogeu em grandes produções como O Magico e Oz e ...E o Vento Levou, em 1939.
Anos 50 - O cinema começa a perder público com a popularização da TV. Hollywood reage, oferecendo aquilo que os espectadores não poderiam ter em casa. Em 1952, é exibido o primeiro longa em terceira dimensão, A Sombra e a Escuridão. O desconforto do óculos de cartolina (foto) e a imagem instável fazem com que a empolgação dure pouco. Apesar de filmes mais empenhados, como Disque M para Matar (1954), de Alfred Hitchcock, o 3D logo é relegado às produções baratas de terror e aventura. Em 1953, a Fox apresenta O Manto Sagrado em CinemaScope, aquele que vai se tornar o mais popular dos sistemas de projeção com tela "esticada".
Anos 70 - Tubarão, de Steven Spielberg, abre a era dos blockbusters em 1975. Um ano depois, o som Dolby faz as salas de cinema tremerem. Em 1977, Guerra nas Estrelas, de George Lucas, se torna outro fenômeno que consolida o modelo dos fenômenos de bilheteria globalizados.
Anos 80 - A ameaça vem do videocassete. Hollywood tenta barrar a novidade sob a alegação de que ela fere direitos autorais. Em 1985, é inaugurada nos EUA a primeira grande rede de locadoras, a Blockbuster. A indústria demora a explorar o filão, mas recupera nas fitas VHS parte do público que sumia das salas. O prejuízo é maior para os pequenos exibidores. Salas menores fecham e começam a pipocar os grandes complexos cinematográficos, sobretudo em shoppings.
Anos 90 - Cineastas de perfil mais autoral apostam no vídeo digital para diminuir custos e preservar a independência artística. Até então, apesar das muitas inovações técnicas, o modelo de captação e projeção era praticamente o mesmo havia cem anos. O computador começa a substituir a moviola mecânica na montagem dos filmes. Em 1995, o desenho animado Toy Story mostra o potencial da computação gráfica. Em 1997, chega o DVD, que se torna uma grande fonte de renda para os estúdios.
Anos 2000 - A popularização da internet em banda larga dissemina na indústria do cinema o susto que a indústria musical já amargava diante da pirataria. O comércio legal de filmes pela rede ainda é incipiente. A sofisticação e o menor custo de home theaters mantêm o público em casa. Para atrair mais gente, uma nova revolução é ensaiada: a volta do 3D, dessa vez maior e melhor.