segunda-feira, abril 27, 2009

Nova tecnologia pode colocar 100 DVDs em um único disco




A General Electric anunciou ter obtido um grande avanço na tecnologia de armazenagem digital de informações, que permitirá que discos de tamanho padronizado abriguem conteúdo quivalente ao de 100 atuais DVDs.

Por enquanto, o avanço na tecnologia de armazenagem que a GE está anunciando funciona penas em laboratório. Será preciso adaptar a nova tecnologia ao uso em produtos que possam ser produzidos em massa e vendidos a preços acessíveis.

Mas os especialistas em sistemas de armazenagem óptica e analistas setoriais que foram informados sobre o desdobramento afirmam que o método promete ser um grande passo adiante na armazenagem digital, e que ele oferece ampla gama de usos potenciais nos mercados comercial, científico e ao consumidor.

"Podemos estar diante da próxima geração de sistemas de armazenagem de baixo custo", disse Richard Doherty, analista da Envisioneering, uma empresa de pesquisa sobre tecnologia.

O trabalho promissor realizado pelos pesquisadores da GE envolve o campo da armazenagem holográfica. A holografia é um processo óptico que não só permite armazenar imagens tridimensionais, como as que existem em muitos cartões de crédito para propósitos de segurança, como também os zeros e uns que servem como unidades básicas de informação digital.

Os dados ficam codificados em padrões de luz armazenados em um material sensível à luz. Os hologramas funcionam como espelhos microscópicos que refratam os padrões luminosos quando um feixe de luz laser os atinge, e assim os dados armazenados em cada holograma podem ser recuperados e decodificados.

A armazenagem holográfica tem a capacidade de condensar dados de maneira muito mais concentrada do que a tecnologia óptica convencional, usada nos DVDs e nos discos Blu-ray, mais recentes e de capacidade ampliada. Nesses produtos, os dados são armazenados em um
padrão de marcas gravadas a laser distribuídas pela superfície do disco.

Até o momento, a armazenagem holográfica não era vista como um caminho de pesquisa que poderia vir a encontrar uso amplo. Mas o trabalho da GE pode representar o passo pioneiro para isso, de acordo com analistas e especialistas. Os pesquisadores da GE utilizaram uma abordagem diferente da que havia sido utilizada em esforços anteriores. Ela depende de hologramas menores e menos complexos - uma nova técnica conhecida como armazenagem micro-holográfica.

Um desafio crucial para a equipe, que está trabalhando no projeto desde 2003, era o de encontrar materiais e técnicas que permitissem que os hologramas menores refletissem luz suficiente para que seus padrões de dados pudessem ser detectados e recuperados.

Os recentes avanços da equipe, que trabalha no laboratório da GE em Niskayuna, Nova York, ao norte de Albany, representam aumento de 200 vezes no poder de reflexão dos hologramas, o que os coloca ao alcance das frequências luminosas hoje legíveis por aparelhos de Blu-ray.

"Estamos perto do necessário", disse Brian Lawrence, o cientista que comanda o programa de armazenagem holográfica da GE. "Nós já atravessamos a barreira da legibilidade".

Na abordagem desenvolvida pela GE, os hologramas ficam dispersos por um disco em formato semelhante ao dos atuais CDs, DVDs convencionais e discos Blu-ray. Com isso, um aparelho capaz de ler os discos de armazenagem micro-holográfica também seria capaz de ler CDs, DVDs e
discos Blu-ray. Mas os discos holográficos, com a tecnologia que a GE desenvolveu, poderiam armazenar até 500 gigabytes de dados. Os discos Blu-ray armazenam 25 ou 50 gigabytes, e um DVD comum apenas cinco gigabytes.

"Caso isso realmente possa ser colocado em prática, o trabalho da GE promete oferecer imensa vantagem na comercialização da tecnologia de armazenagem holográfica", disse Bert Hesselink, professor da Universidade Stanford e especialista nesse campo de pesquisa.

A equipe da GE planeja apresentar seus dados de pesquisa e resultados de laboratório em uma conferência sobre armazenagem óptica de dados em Orlando, Flórida, no mês que vem.

No entanto, dizem os analistas, a viabilidade prática da tecnologia da GE ainda não foi provada, e pouco se sabe sobre os aspectos econômicos envolvidos.

A empresa se concentrará inicialmente em vender a tecnologia em mercados comerciais, como estúdios de cinema, redes de televisão e centrais de pesquisa médica e hospitais, para armazenar imagens que requerem uso pesado de dados, como filmes de Hollywood e tomografias cerebrais. Mas vender a tecnologia a um mercado empresarial mais amplo e diretamente ao consumidor é a meta final.

Para tanto, a GE terá de trabalhar com parceiros a fim de licenciar sua tecnologia e seu conhecimento de armazenagem holográfica, e a empresa já está negociando com grandes fabricantes de eletrônicos e de sistemas de armazenagem, disse Bill Kernick, que comanda a divisão de vendas de tecnologia da GE. A pesquisa holográfica era inicialmente parte do trabalho da GE com plásticos, em uma divisão que a companhia vendeu dois anos atrás à Saudi Basic Industries, por US$ 11,6 bilhões.

Tradução: Paulo Migliacci ME

The New York Times

Coppola vai exibir novo filme em mostra paralela de Cannes

25/04/2009 - 18:26 - Redação - último segundo

PARIS – Ignorado entre os filmes selecionados para competição no Festival de Cannes, "Tetro", o novo longa-metragem de Francis Ford Coppola ("Apocalypse Now", "O Poderoso Chefão"), será exibido na Quinzena dos Realizadores, mostra paralela do evento na riviera francesa.

Vincent Gallo protagoniza "Tetro" / Divulgação

"Tetro" havia sido convidado para uma exibição especial, mas Coppola, decepcionado, não aceitou, já que tinha planos maiores para o filme em Cannes. O longa, então, ia ser projetado no Festival Internacional de Seattle, mas os organizadores da Quinzena dos Diretores conseguiram convencer o cineasta a estrear sua nova produção na mostra.

A comédia gay "I Love You Philip Morris", estrelada por Jim Carrey, Ewan McGregor e Rodrigo Santoro está entre os filmes selecionados ao lado de Coppola. O único representante brasileiro é o curta-metragem "SuperBarroco", de Renata Pinheiro. O formato também garantiu outros dois concorrentes brasileiros na Semana da Crítica: "Elo" e "Espalhadas pelo Ar", ambos de Vera Egito.

O 62º Festival de Cannes acontece de 13 a 24 de maio e será aberto pela animação "Up", dos estúdios Disney-Pixar. Alguns dos maiores cineastas do mundo vão disputar a Palma de Ouro, entre eles Pedro Almodóvar ("Abrazos Rotos"), Lars Von Tier ("Anticristo"), Alain Resnais ("Les Herbes Folles"), Quentin Tarantino ("Inglorious Bastards"), Michael Haneke ("Das Weisse Band") e Ang Lee ("Taking Woodstock").

"À Deriva", de Heitor Dahlia, único longa-metragem brasileiro selecionado para Cannes, será exibido na seção "Um Certo Olhar". Veja as produções selecionadas para a Quinzena dos Realizadores:

- "Ajami", de Scandar Copti e Yaron Shani (Alemanha, Israel)
- "Amreeka", de Cherien Dabis (EUA)
- "Les Beaux Gosses", de Riad Sattouf (França)
- "Carcasses", de Denis Coté (Canadá)
- "Daniel y Ana", de Michel Franco (México)
- "Eastern Plays", de Kamen Kalev (Bulgária)
- "La Famille Wolberg", de Axelle Ropert (França)
- "Go Get Some Rosemary", de Benny e Josh Safdie (EUA)
- "Here", de Tzu-Nyen Ho (Cingapura)
- "Humpday", de Lynn Shelton (EUA)
- "I Love You Phillip Morris", de Glenn Ficarra e John Requa (EUA)
- "J’ai tué ma mère", de Xavier Dolan (Canadá)
- "Like You Know It All", de Hong Sangsoo (Coréia do Sul)
- "Karaoke", dey Chan Fui (Chris) Chong (Malásia)
- "La Merditude des choses", de Felix Van Groeningen (Bélgica)
- "Navidad", de Sebastian Lelio (Chile)
- "Ne change rien", de Pedro Costa (Portugal)
- "Oxhide II", de Liu Jiayin (China)
- "La Pivellina", de Tizza Covi e Rainer Frimmel (Áustria)
- "Polytechnique", de Denis Villeneuve (Canadá)
- "Le Roi de l’évasion", de Alain Guiraudie (França)
- "La Terre de la folie", de Luc Moullet (França)
- "Tetro", de Francis Ford Coppola (Argentina, Espanha)
- "Yuki & Nina", de Nobuhiro Suwa e Hippolyte Girardot (França, Japão)

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O novo filme de Francis Ford Coppola vai ser exibido na noite inaugural da Quinzena dos Realizadores, uma secção paralela altamente prestigiada e que investe numa programação de autores emergentes ou com forte marca autoral.

O próprio Coppola assumiu a inclusão do filme na Quinzena salientando que esta obra mais pessoal é uma espécie de grito de independência e que deve estar no local onde são exibidos filmes de novos realizadores.

" I am extremely pleased to bring TETRO to Director's Fortnight. This film embodies my original passions as a filmmaker, and is a reflection of my goals and ideals when I first began. It is so difficult to work in a personal way in the cinema today, between the business constraints and commercial realities, that you must let your work be a cry for independence, which is why it is so appropriate that TETRO is premiered in the Director's Fortnight, where young filmmakers go."

O filme chegou a ser apontado para a selecção oficial do festival. O regresso de Coppola adquire uma dimensão de grande efeméride, porque "Apocalipse Now" foi premiado há 20 anos com a Palma de Ouro.

"Tetro" é sobre os conflitos entre irmãos de uma família de origem italiana emigrada na Argentina. Foi rodado em Buenos Aires, com Vincent Gallo, Maribel Verdú e Carmen Maura. Há informação no sítio oficial e o próprio Coppola introduziu o filme nesta declaração difundida na internet, onde sublinha que este é o primeiro argumento que escreve desde "The Conversation" em 1974.

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Francis Ford Coppola faz 70 anos prestes a estrear novo filme

Com cinco prêmios Oscar na carreira e diretor de 'O Poderoso Chefão' está prestes a lançar 'Tetro'

AP

Coppola e sua filha Sophia

WASHINGTON - O cineasta que presenteou o mundo com a trilogia de O Poderoso Chefão e Apocalypse Now, Francis Ford Coppola, completa nesta terça-feira, 7, 70 anos, com cinco prêmios Oscar em sua carreira e muita vontade de seguir fazendo cinema, como demonstra sua filme mais recente, Tetro, pronto para a estreia nos cinemas.

Com grandes sucessos e enormes fracassos, Coppola soube passar por cima de tudo isso e, entre filmes sob encomenda e projetos personalíssimos, construiu uma das corridas mais ecléticas e interessantes de Hollywood.

Nascido em Detroit, no dia 7 de abril de 1939, em uma família de origem italiana, é filho da Italia Pennino e do compositor e diretor de orquestra Carmine Coppola, que colaborou em algumas das trilhas sonoras de seus filmes.

Transferida a família para Nova York, Coppola passou sua infância no Queens e aos nove anos contraiu poliomielite (paralisia infantil), doença que lhe manteve um ano na cama, período no qual se distrairia criando peças com marionetes e filmes familiares em Super 8 (câmera da época).

Em 1960, Coppola se graduou na Universidade Hofstra e, em seguida, fez especialização de Belas Artes em direção cinematográfica na Escola de Cinema da Universidade da Califórnia, em Los Angeles. Embora já tivesse realizado diversos trabalhos como diretor, sua estreia em longas-metragens foi com Demência 13 (1969), da qual foi diretor e roteirista, função que desempenhou tanto para suas próprias produções quanto para as de outros.

Após alguns trabalhos nos quais não chamou especialmente a atenção, chegou O Poderoso Chefão, de 1972, uma joia do cinema, que marcou um antes e um depois nos filmes sobre a máfia e que é considerado o segundo melhor filme da história pelo Instituto de Cinema Americano, superado apenas por Cidadão Kane (1941), de Orson Welles.

Coppola não estava convencido de levar à grande tela o best-seller de Mario Puzzo, mas finalmente embarcou em um projeto que lhe lançou ele e Al Pacino ao estrelato e que se transformou em uma dos filmes de maior bilheteria de todos os tempos.

Ele já tinha ganhado um Oscar como roteirista de Patton: rebelde ou herói? (1970) e O Poderoso Chefão lhe proporcionou o segundo, também pelo roteiro -assim como o de Melhor Ator, para Marlon Brando e o de Fotografia -, além de todo o reconhecimento que pudesse desejar.

Isso lhe permitiu rodar A Conversação (1974), uma mudança radical de gênero, que foi seu primeiro grande fracasso comercial, mas que foi bem recebido pela crítica, ganhando a Palma de Ouro no Festival de Cannes e que, com a passagem dos anos, passou a ser considerado um de seus melhores filmes.

Também em 1974, filmou a segunda parte de O Poderoso Chefão, que apesar de arrecadar muito menos do que a primeira, conseguiu três prêmios Oscar (o primeiro de Coppola como diretor, assim como os de melhor filme e roteiro) e lhe permitiu iniciar em um projeto que iria acabar sendo um autêntico pesadelo.

A filmagem de Apocalypse Now, adaptação do complexo romance O Coração das Trevas, de Joseph Conrad, foi um inferno no qual aconteceram todos os problemas, técnicos, econômicos, pessoais e climatológicos, imagináveis.

O orçamento disparou, o protagonista, Martin Sheen, sofreu um infarto, os cenários foram destruídos por uma tempestade tropical, a filmagem eternizou e os trabalhos de pós-produção não ficaram atrás, tanto que ele só foi lançado cinco anos depois O Poderoso Chefão - Parte 2, em 1979.

O resultado é um filme obscuro, complexa e difícil, com interpretações impressionantes, especialmente de Marlon Brando, fotografia e música espetaculares, que foi imediatamente considerado uma obra prima e ganhou outra Palma de Ouro em Cannes.

Após este complexo processo, porém, Coppola começou outro projeto que não seria menos complicado e que iria mudar sua trajetória profissional: O Fundo do Coração (1982), um musical que foi um gigantesco fracasso comercial.

Coppola perdeu seus estúdios, sua casa e seu patrimônio e teve que aceitar trabalhos sob encomenda para poder pagar as dívidas, como Cotton Clube (1984) e Peggy Sue - Seu Passado a Espera (1986).

Mesmo assim, também teve tempo para rodar filmes estupendos como O Selvagem da Motocicleta e Vidas Sem Rumo, lançados em 1983.

Ainda sem sair de sua crise econômica decidiu fazer a terceira parte de O Poderoso Chefão (1990), muito menor do que as duas primeiras quanto à qualidade e às ambições.

Drácula de Bram Stoker (1992), Jack (1996) e O Homem Que Fazia Chover (1997) foram alguns de seus seguintes trabalhos, nos quais seguiu mostrando talento, mas sem encantar como fizera anteriormente.

Agora, à espera do estreia de Tetro, ele dedica-se também à produção, como, por exemplo dos filmes de sua filha Sophia, que também despontou como diretora.

No entanto, Francis Ford Coppola, mantém claras suas prioridades. Amo o cinema; gosto de outras coisas, como o vinho e a comida, mas o cinema é mágico e eterno. Sempre aprendo coisas boas.



domingo, abril 26, 2009

A Tirania de Walt Disney

O magnata da fantasia Baseada em baú de arquivos de Walt Disney, vasculhados ao longo de sete anos, biografia que chega ao Brasil desconstrói mitos em torno do gênio da animação

Alfred Eisenstaedt/Efe

Walt Disney, em 1950, à frente de alguns de seus personagens

RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL

Era inevitável, e Walt Disney logo percebeu. Um dia, alguém ganharia uns bons trocados às custas de sua história -que, nos anos 50, já incluía uma revolução nas animações, um gigantesco mercado de produtos associados a seu nome e a criação do parque Disneylândia.
Em 1956, então, ele aceitou dar uma série de entrevistas a um jornalista, com a condição de que sua primeira biografia autorizada, "The Story of Walt Disney", saísse com a assinatura de Diane Disney Miller. Se era para alguém faturar em cima dele, que fosse a filha.
Depois dessa biografia, vieram outras dezenas, meticulosas, capengas, inócuas, sensacionalistas -incluindo uma sob o duvidoso título "O Príncipe Sombrio de Hollywood".
A que chega amanhã às lojas do país, "Walt Disney: O Triunfo da Imaginação Americana" (Novo Século), do americano Neal Gabler, foi feita a partir de uma fonte, pode-se dizer, até mais confiável que as lembranças de Disney (1901-1966).
A origem de suas 944 páginas (incluindo mais de 200 só de referências) são milhares de desenhos, cartas e outros documentos reunidos ao longo da vida de Disney e que, arquivados nos estúdios em Burbank, Califórnia, até então só haviam sido parcialmente liberados.
Gabler, jornalista experiente, autor do best-seller "An Empire of Their Own: How the Jews Invented Hollywood" (um império só deles: como os judeus inventaram Hollywood; não lançado no Brasil), teve total acesso a esses registros e os pesquisou durante sete anos.
"Acontece que Walt amava fantasiar sua vida. Ele era, antes de tudo, um contador de histórias, e adorava alimentar sua própria mitologia", diz Gabler, 59, à Folha, por telefone, de Nova York. "A um ponto em que eu não me sentia confortável em usar a versão de Walt se não pudesse checá-la."
No livro, o autor coloca Disney, o contador de histórias, contra Disney, o jovem empreendedor que tropeça na própria ansiedade, que erra muito e que relata seus infortúnios em cartas para a mulher, o irmão (Roy, que comandou os estúdios com ele desde o começo) e mesmo desafetos.
"Em vez de apenas lembranças, tive em mãos documentos do momento, por exemplo, em que Disney, depois de concluir "Steamboat Willie" [o primeiro desenho que sincronizava som e imagem], tentava vender Mickey para algum distribuidor em Nova York", diz Gabler.

Treinador de camundongo
São com certeza versões menos românticas que aquela, do próprio Disney, segundo a qual ele criou Mickey após conseguir treinar camundongos.
"Nunca esquecerei o grito que uma garota deu quando entrou em meu escritório um dia e encontrou um rato sentado em minha mesa enquanto eu o desenhava", ele relata, em uma entrevista citada na biografia.
Na verdade, segundo confirmou Gabler, Disney praticamente já não desenhava aos 23 anos, quando comandava seu pequeno estúdio, e quatro antes de Mickey ser criado.
Ele foi de fato um dos mentores intelectuais do personagem (e lhe deu voz até os anos 40, quando se cansou de arranhar a garganta com o falsete e passou a tarefa a um técnico de som), mas seu esboço de Mickey não ficou bom. "Era comprido e magro", lembraria um colega.
Disney, diz Gabler, até sabia desenhar Mickey, "mas certamente não tão bem quanto Ub Iwerks", o dono do traço de personagem nas primeiras animações. Iwerks pediu as contas menos de dois anos após a estreia do camundongo, sentindo-se lesado por Disney ficar com todos os louros. Ele acabaria voltando aos braços (ou melhor, aos estúdios) do colega anos depois, quando este já era internacionalmente famoso.

"Príncipe sombrio"
A fama de "príncipe sombrio" -que ganhou força com a questionável biografia de Marc Eliot, lançada em 1993- tem seu fundamento. "Walt Disney não era um homem fácil, e tento dar essa noção. Houve momentos, enquanto escrevia, em que me senti profundamente incomodado com suas atitudes, e um deles foi durante a greve nos estúdios", diz Gabler.
Em princípio, Disney tentava lidar com os funcionários de igual para igual, mas os estúdios se tornaram tão grandes que, a certa altura, ele não tinha como saber o nome de todos os seus empregados. Foi então -quando havia até quem "desmaiasse de fome", segundo o livro, sem tempo nem dinheiro para almoçar- que os funcionários decidiram paralisar.
"Walt Disney não agiu particularmente bem ali", diz Gabler, "e uma das coisas que fez foi fugir. Ele deixou os estúdios e foi para a América Latina".
A greve, em 1941, coincidiu com a ideia do governo de usar Walt Disney como uma espécie de embaixador dos EUA na América Latina -numa época em que os Aliados precisavam conquistar os países abaixo da linha do Equador para evitar a aproximação deles com o Eixo.
Enquanto exaltava o Brasil e seus vizinhos em "Alô, Amigos" (1943) e "Você Já Foi à Bahia?" (1944), com Zé Carioca, Walt Disney vivia também seus anos mais tristes, segundo Gabler -produzindo curtas por encomenda do governo norte-americano, como aqueles em que Pato Donald aprende a pagar seus impostos ou no qual, vestido de nazista, sofre nas mãos dos oficiais da SS.

DISNEY NÃO SE INTERESSAVA PELAS HQS

Ao terminar de ler a biografia "Walt Disney - O Triunfo da Imaginação Americana", muitos leitores sentirão falta de remissões ao Tio Patinhas. O autor, Neal Gabler, comenta: "Disney investia as suas energias naquilo que realmente o interessava. Foi assim com o Mickey, a "Branca de Neve" e a Disneylândia. Ele não tinha absolutamente nenhum interesse pelos quadrinhos publicados sob seu nome". Tio Patinhas, assim como a cidade Patópolis, foram criados por Carl Barks (1901-2000) apenas para as HQs.
Análise/livro/"Walt Disney: O Triunfo da Imaginação Americana"

Livro expõe criador tão genial quanto tirânico

Biografia de Disney faz bom desenho da figura centralizadora e anticomunista, mas desliza ao deixar vida familiar do empresário em segundo plano

RUY CASTRO
COLUNISTA DA FOLHA

Ao decidir mergulhar em Walt Disney, um biógrafo precisa se preparar para enfrentar as perguntas que todo mundo sempre quis fazer e que nunca foram respondidas satisfatoriamente.
Ele era mesmo o genial criador de filmes como "Branca de Neve e os Sete Anões", "Pinóquio", "Dumbo", "Bambi", "Cinderela" e "Peter Pan" ou só o "administrador" desses longas, já que não usava um lápis desde os anos 20, não desenhou Mickey e nem sua famosa assinatura era sua?
É também verdade que, embora insistisse em ser chamado de Walt por seus funcionários, comesse junto com eles e trabalhasse mais do que qualquer um, era um tirano que exigia veneração -e ai de quem incorresse no seu mais ligeiro desagrado? É verdade também que, além de anticomunista, ele era antissemita? E, finalmente, que se deixou congelar ao descobrir que tinha câncer, para que o "ressuscitassem" quando se descobrisse a cura?
Neal Gabler, o autor de "Walt Disney: O Triunfo da Imaginação Americana", não espera o leitor chegar ao fim de suas 944 páginas para decifrar a última questão. Na segunda página do texto, já acaba com o mistério: não, Walt não foi congelado, isso nunca passou de lenda. Foi cremado, e suas cinzas, depositadas no cemitério de Forest Lawn, em Los Angeles, perto de seu estúdio.
E quem o tivesse conhecido sabia que não poderia ser diferente: nem morto Disney se afastaria do trabalho. Quanto às outras perguntas, a resposta é sempre sim -e não.
Não, ele não desenhava -cada personagem de cada filme era obra de um ou de vários animadores. Mas, se havia um criador nos filmes, esse criador era ele. Numa época (fins dos anos 20) em que os desenhos animados se limitavam a filmecos mudos e em preto e branco, de oito minutos, Disney foi o primeiro a acreditar em desenhos sonoros, em cores e com 1h20 de duração.

Palavra final em tudo
Ele exigia que os filmes contassem uma história -não se limitassem a uma saraivada de "gags"- e que os personagens fossem multidimensionais (levou anos para estabelecer a personalidade de cada anão em "Branca de Neve"). E era sua a palavra final sobre cada esboço, cada desenho, cada sequência. Lutou pela animação realista: cada gesto de cada personagem tinha de ser mostrado, mesmo que isso obrigasse a produzir milhares de desenhos a mais. Ao mesmo tempo, controlava o pulso das cenas. Por exemplo, a morte da mãe de Bambi: Walt proibiu que o público visse a corça sendo alvejada -morta, então, nem pensar.
Hoje, a cena seria um festival de tripas expostas. Mas Walt fez milhões de crianças chorarem sem apelar ao escatológico. Sim, ele era anticomunista. Em 42, declarou guerra ao sindicato de animadores, que julgava comunista, gesto que dividiu a categoria entre pró e anti-Disney, o que só viria a prejudicá-lo.
Mais tarde, no macarthismo, foi testemunha "amigável" dos inquisidores, embora não tenha entregado ninguém. E não há provas, nenhum indício, de que fosse antissemita. Mas que era um tirano não há dúvida: um homem que buscava o poder absoluto, não para ganhar dinheiro, mas a fim de produzir a perfeição.
Para desespero de seu irmão Roy (que estava para ele como o Grilo Falante para Pinóquio), quase faliu o estúdio para fazer de "Branca de Neve" algo que nunca se vira na animação. Como o filme foi um estouro de público e crítica em 1937, isso pareceu justificar sua atitude de dez anos antes, ao arrancar do estúdio a placa onde se lia "Disney Bros." e substituir por "Walt Disney".

Atribulações iniciais
Neal Gabler demora a fazer a história decolar. Empolgou-se com a documentação a que teve acesso e queimou suas 200 páginas iniciais com as atribulações de Walt e Roy para firmar o estúdio.
Com isso, teve de compensar mais à frente, correndo com a história, ignorando personagens importantes (Tio Patinhas está ausente, e o império de quadrinhos só é citado de raspão) e se aprofundando pouco em Walt como homem, marido e pai. O que é pena, a julgar por diálogos como aquele em que uma amiga de sua mulher, Lillian, exclama, orgulhosa, "Walt é um gênio!", e Lillian responde, secamente: "Você acha? Experimente ser casada com um gênio".
Lillian podia ser casada com Walt, mas Walt não era casado com ninguém exceto com seu estúdio, seus personagens, seus filmes, suas técnicas de animação e, por fim, seus parques temáticos. Ele não estava exagerando ao declarar, nos anos 50: "Nunca amei uma mulher como amo Mickey Mouse". Não por acaso, em seus filmes, os grandes vilões eram as mulheres e os gatos -não confiava e não gostava delas nem deles.
Ao gênio que descobriu como "animar o inanimado" -definição do próprio Walt-, faltava justamente a "anima", a alma, que separa os homens dos bonecos desenhados.


WALT DISNEY: O TRIUNFO DA IMAGINAÇÃO AMERICANA

Autor: Neal Gabler
Tradução: Ana Maria Mandim
Editora: Novo Século
Quanto: R$ 89,90 (944 págs.)
Avaliação: bom


Crítica/cinema/"Terra"

Novo filme da Disney é colagem de clichês

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA

Documentários sobre a vida selvagem têm uma missão nobre: inspirar em crianças o respeito pela natureza e infundir-lhes o espírito da conservação. O abuso desse gênero pelos canais de TV paga pode estar produzindo o efeito inverso -um imenso bode de tudo quanto é bicho fofo. Meus filhos, de 11 e 6 anos, trocam de canal sempre que eu paro para ver o Animal Planet.
Já sei que não os levarei ao cinema para ver "Terra", documentário sobre a vida selvagem que marca a estreia da Disney nesse filão supersaturado. "Terra" é uma longa (96 minutos) e sonolenta colagem de clichês: da narração tediosa em "off" sobre o "círculo da vida" à música instrumental de fundo à cena do guepardo pegando o antílope em planície africana.
O filme segue, durante um ano, migrações de grupos de animais. Seu fio condutor seriam os ciclos hidrológicos e meteorológicos causados pela inclinação do eixo da Terra, que nos dá as estações do ano. Os "atores" são os de sempre (baleias-jubarte, renas, ursos-polares e os herbívoros africanos), bichos fotogênicos, que habitam lugares abertos, como savanas e planícies.
Como em todas as coisas Disney, há os "malvados", encarnados por lobos, leões e morsas. Ainda assim, não aparece uma gota de sangue. É Disney, não se esqueça. Coerência de roteiro? Deixa para lá. Após mostrar as baleias chegando dos trópicos à Antártida, "Terra" pula para uma sequência de marcha de pinguins e fecha o trecho com uma imagem de aurora austral -que na dublagem foi chamada de "boreal".
Aqui, roteiro é o que menos importa. O que vale são as imagens espetaculares, como a cena noturna dos leões tentando atacar os elefantes. Mas nada redime o filme, cujo momento mais divertido é o "making of" na hora dos créditos.


TERRA

Direção: Alastair Fothergill/Mark Linfield
Produção: EUA, Inglaterra, Alemanha, 2007
Onde: em cartaz no Kinoplex Itaim, Jardim Sul e circuito
Classificação: livre
Avaliação: ruim

Duelo de Titãs



PESOS-PESADOS DO CINEMA FRANCÊS, CLAUDE CHABROL E GÉRARD DEPARDIEU FALAM DE SEU NOVO FILME, "BELLAMY", DE LITERATURA E DA CRISE DA SÉTIMA ARTE


"Para mim, Godard virou um pouco o Karl Lagerfeld da 7ª arte"
(Depardieu)


PASCAL MÉRIGEAU

Eles vinham brincando havia anos com a ideia de trabalharem juntos. Desse desejo comum nasceu "Bellamy" [ainda sem data de lançamento no Brasil], filme dedicado "aos dois Georges" (Simenon, escritor, 1903-89, e Brassens, músico, 1921-81).
Gérard Depardieu tinha conhecido o filme no dia anterior, e o encontro estava marcado para as 13h. Ao meio-dia telefonou para dizer que seria às 12h30, em razão de um encontro que tinha marcado às 14h.
Claude Chabrol já estava nas redondezas; Gérard chegou apressado, mas dominado por um desejo irreprimível de comer escargots.
Duas horas e meia mais tarde, todos ainda estavam em volta da mesa.
Quando Depardieu partiu, depois de devorar duas dúzias de moluscos e um prato de vitela com feijão e muito atrasado para seu encontro (algo raríssimo em se tratando dele), Claude permaneceu mais um pouco para falar de Gérard.

GÉRARD DEPARDIEU - Achei o filme muito comovente. Ele me fez pensar no cinema que amo, acrescido de mais alguma coisa, aquilo que chamamos de estilo. Maurice Pialat [1925-2003] e François Truffaut [1932-84] tinham estilo...
CLAUDE CHABROL - Mas não era o mesmo!
DEPARDIEU - Não, mas me deixa espantado que um cineasta que fez 50 filmes se mantenha tão ligado a sua época. Seu filme me deu a impressão de fazer parte de uma sociedade privilegiada, a sociedade da cultura.
A menor réplica tem um estilo e, contrariamente ao que se pensa geralmente, para que seu estilo seja reconhecível é preciso que o autor tenha grande humildade.
A ambiguidade dos personagens é extraordinária. É o caso de Bellamy, esse delegado de polícia vítima de uma imagem de "astro" que só existe na cabeça dos outros.
Ele a vê no olhar de sua mulher (Marie Bunel), de seu irmão (Clovis Cornillac), do personagem representado por Jacques Gamblin.
CHABROL - O que você descreve é a verdadeira realidade do filme. O resto só está ali para ilustrar o real e ajudar as pessoas a compreendê-lo. Com uma pequena brincadeira, que está no fato de que o lado fictício é tirado de uma notícia de jornal e que a realidade é imaginária.
DEPARDIEU - É como na cozinha: quando não há nada a fazer senão brincar, você faz a receita à perfeição! Não estava tudo claro no roteiro; eu tive um pouco de medo desses flashbacks, mas na tela eles passam sozinhos, na fronteira entre o que o personagem vive e o que imagina.
CHABROL - Houve uma hora em que pensei em dar um tratamento diferente a esses momentos. Chegamos a pensar em colori-los, mas teria sido muito artificial.
DEPARDIEU - Cada resposta no filme é precisa; o menor detalhe tem sua razão de ser.
A construção é o elemento de que mais sinto falta no cinema de hoje. Como Truffaut no passado, você fala de cinema e de sua relação com a sociedade, mas hoje o que se procura é apenas o espetáculo e a eficácia. Aqui, há a vida.
O irmão, por exemplo, transmite uma ideia de coitado que remete ao literário. Ele me faz pensar em Dostoiévski.
CHABROL - Procuro revelar o que é um indivíduo para, assim, me aproximar da natureza humana. Sem tentar esgotar o assunto! Com relação à construção, você tem razão. Vejo cada vez mais filmes feitos para a TV que não têm mais forma humana: à medida que avançam, em lugar de revelar, se tornam cada vez mais uma coisa qualquer, sem sentido, e a gente não entende mais nada.
DEPARDIEU - Quando li o roteiro tive a impressão de que seria um filme de ambiente, de estado de espírito. Mas então fui percebendo que cada resposta era capaz de provocar risos. É esse o grande talento: inventar respostas que, uma vez ditas, se tornam engraçadas porque são verdadeiras.
CHABROL - Basta decidir que o personagem terá humor. Por exemplo, quando vai à loja de materiais de construção e lhe perguntam se veio comprar pregos, e ele responde: "Espero que não!".
DEPARDIEU - Enfim, para escrever isso é preciso ter mais de uma hora de voo. Não sei se Bellamy tem humor, mas sei que é um homem que não escapa de si mesmo.
CHABROL - Acaba ganhando consciência da realidade das coisas.
DEPARDIEU - Sua verdadeira motivação é o desejo de reencontrar sua mulher.
CHABROL - Tenta por todos os meios reencontrar a si mesmo!
DEPARDIEU - Há momentos no filme em que, durante sete ou oito minutos, há uma reunião de coisas que de repente se liberam. A gente está no escuro, no abstrato, e a grande emoção vem de saber que podemos estar ali. Enfim, é a emoção, algo que não requer explicações. Voltamos a Flaubert. As pessoas se superam em suas conquistas amorosas.
CHABROL - Com a única condição de evitar qualquer romantismo. Simenon não era um romântico, e nisso ele era bem mais próximo de Dostoiévski do que de Balzac.
DEPARDIEU - Pronto: "Bellamy" fica entre Flaubert e Dostoiévski. Gosto disso.
Hoje se tornou muito difícil encontrar prazeres excepcionais suscitados por emoções simples. Nossa humanidade é totalmente atacada; reconhecer um gosto virou praticamente uma façanha. Por acaso, os escargots...
Essa noite liguei a televisão, estava passando um filme e eu vi imediatamente que era um dos seus. E não porque tinha Stéphane Audran...
CHABROL - Se bem que ajuda!
DEPARDIEU - Mas o azul do vestido, os toques de laranja, os enquadramentos, tudo isso só podia ser seu trabalho. Você faz pastéis, sendo que [Maurice] Pialat pintava com uma faca.
Basta um plano para a gente saber que é um filme de Chabrol. Isso é estilo, isso é uma marca própria.
Do mesmo modo como [Elia] Kazan sempre usava objetivas de 18, 25...
CHABROL - Nem sempre!
DEPARDIEU - Talvez, mas em "A Terra do Sonho Distante". É sua identidade, sua marca.
CHABROL - Esses caras não precisavam se disfarçar. Hoje as pessoas que estão na moda são artistas que acham que são obrigados a se disfarçar.
DEPARDIEU - Porque o que produzem não serve para nada! Como a produção deles é inútil, eles se vendem como proprietários. Para mim, Godard virou um pouco o Karl Lagerfeld da sétima arte.
Sei que há quem goste muito disso, mas para mim o que ele faz hoje é entediante. Não existe um movimento suficientemente importante para passar por cima das tendências.
CHABROL - O filme que ele fez com você foi interessante ("Infelizmente para Mim", de 1993). Mas você tem razão quando diz que hoje só há modismos. O primeiro filme da nouvelle vague foi "Toni". [Jean] Renoir o fez em 1934, e foi de um modernismo absoluto. Então as modas...
DEPARDIEU - Atenção, preto e branco! Portanto, velho e ultrapassado! Sinal externo do cultural, sensibilidade que não é de hoje.
"Bellamy" vai na contramão -carrega essa memória em si.
CHABROL - É uma questão de encontrar a proporção certa entre a trama e os personagens. E eu me esforcei conscientemente para que a trama fosse claramente separada dos personagens. (...)
[Sobre escrever e representar] A única vez em que escrevi para um ator foi uma encomenda, "Armadilha para um Lobo", para Jean-Paul Belmondo (1972). Entendi rapidamente que aquilo era uma brincadeira e que eu não tinha outra saída senão levá-la adiante.
Escrevi "Bellamy" para Gérard, queria deixá-lo espantado. Eu lhe dizia que rodaríamos o filme em dois anos; ele não acreditava e dizia o que dizia sempre, que o filme já estava praticamente feito. Então mandei o roteiro a ele e nós o rodamos em Nîmes, porque foi ali que nos conhecemos.
DEPARDIEU - Isso não é inteiramente verdade. Ele também é preguiçoso! Aliás, a contradição é que as pessoas ao mesmo tempo o tacham de preguiçoso e dizem que ele faz demais. É uma crítica que também pode ser feita a mim.
O filme é fruto de nosso desejo de contar uma história com o que conhecemos do cinema e da história do cinema.
Eu não procurei saber mais que isso, e, quando recebi o texto, encontrei 20 histórias dentro da história. Por trás de cada vírgula, você enxerga mudanças de plano. São verdadeiras pontuações.
CHABROL - É verdade, eu edito com vírgulas. [A atriz] Isabelle Huppert também entendeu isso. Para mim, quanto mais a coisa é preparada, melhor funciona. Para não cair na autobiografia, Odile Barski [corroteirista] se encarregou de tudo o que remete um pouco a mim, especialmente as relações de Bellamy com sua mulher, que se parecem com minhas relações com Aurore.
Mas era Gérard que me interessava -a ideia de encontrar um disfarce que conviesse à expressão de sua personalidade, tal como eu a queria mostrar. Gérard possui uma espécie de sabedoria; é meio a meio. Essa é também minha ideia da vida.
Quando lhe perguntaram se a vida era resultado de seus próprios esforços ou do acaso, Fritz Lang respondeu: "Meio a meio".
Acho que as pessoas frequentemente são tolhidas por seu absolutismo: o filme termina num plano metade mar, metade céu.
[Nesse momento Depardieu parte para seu encontro.]
Gérard faz parte das pessoas para as quais as outras existem. Ele sente a necessidade de uma relação verdadeira, é por isso que tem necessidade de tocar as pessoas fisicamente. Ele tenta esconder isso; a questão é saber por que quer escondê-lo.
Tenho uma queda tremenda por ele. A frase sobre a dignidade -"encontrei uma certa forma de dignidade em desprezar a mim mesmo"- é a chave do filme. Eu disse a ele antes de filmar que, de certo modo, é assim que o vejo, embora no caso dele não se trate de desprezo, mas de autoironia.
E disse isso para que não ficasse constrangido. Quando ele pronunciou a frase, senti um arrepio nas costas.


A íntegra desta conversa saiu na revista francesa "Le Nouvel Observateur". Tradução de Clara Allain .

Quem é Depardieu

DA REDAÇÃO

Gérard Depardieu (1948) é um dos mais celebrados atores franceses em atividade. Atuou em filmes de Bernardo Bertolucci ("1900"), Alain Resnais ("Meu Tio da América") e François Truffaut ("O Último Metrô").
Em 1990, ganhou o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes pelo filme "Cyrano" (de Jean-Paul Rappeneau), pelo qual também foi indicado ao Oscar.
Interpretou ainda o gaulês Obelix em três filmes adaptados da HQ francesa "Asterix".

Quem é Claude Chabrol

DA REDAÇÃO

Nascido em Paris, Claude Chabrol (1930) estudou ciência política na Universidade Sorbonne. Nos anos 50, começou a escrever para a revista "Cahiers du Cinéma" -epicentro da nouvelle vague e onde também trabalharam Godard e Truffaut. Mais tarde, com o dinheiro de uma herança, produziria e dirigiria "Nas Garras do Vício" (1958), um dos primeiros filmes do movimento.
Em 2005, recebeu o Prêmio René Clair pelo conjunto da obra.

Pele de Lobo


Angeli

por HELOÍSA HELVÉCIA

Angeli sossegou na vida privada, mas nem por isso o cartunista mais conhecido do país abre mão de provocar com seu trabalho ardido e de contribuir como mau exemplo para esse "mundo limpinho"

Até que enfim Angeli chegou. Atrasou-se para a sessão de fotos, dormiu só três horas na noite anterior. Chegou atrás dos infalíveis óculos escuros, mas não mascarado.

"Aqui a gente ainda pode fumar, não?", disse, ácido, antes da primeira pose, transferindo o malrborão do bolso do jeans para a guarda de Carol, sua terceira mulher e também a empresária, a assessora, o office-boy, a secretária, "a que toma-conta-de-tudo" relacionado à vida e à obra do chargista mais popular do país.

O mais popular e o melhor, segundo as últimas 12 edições do HQ Mix, principal honraria das artes gráficas brasileiras. Todo ano, Angeli sai da premiação com um troféu na mão e um tormento na cabeça: "Volto pensando que preciso avançar na linguagem, depurar o desenho, mudar a fórmula. Não posso cair no normal. Aí viro o pior".

O cara que, sem nenhuma piedade, fez barba, bigode e topete nos últimos presidentes brasileiros anda evitando caricaturas. Hoje, acha "meio banana" desenhar político.

Principalmente depois de saber que José Sarney coleciona ilustrações de si mesmo. E de ouvir do senador: "Você é o melhor". Diz que se sentiu ofendido. "Busco o humor que político nenhum possa capitalizar. Aquilo foi uma derrota para mim. Mas valeu, me fez pensar mais."

Pensar mais resume a filosofia de trabalho segundo a qual "o que sai rápido e sem esforço não é bom". Ano após ano, Angeli vem refinando o comentário visual que publica na página A2 da Folha desde 1973.

Cansou de rabiscar homenzinhos com balõezinhos, acha isso "ridículo" ou, na melhor hipótese, um embrião sobre o qual será preciso suar até que desapareçam pessoinhas e falas. "É sofrido, mas é gostoso."

Mais sofrido ainda quando chega a hora de despachar para o jornal o recheio do seu quadrado e o virginiano meticuloso, 20 cigarros fumados e dez unhas roídas, ainda não está feliz com a expressão da ideia. Fica de manhã até a noite limpando a charge -se é que dá para usar esse verbo no caso de um desenhista que jamais economizou em cuspe, vômito, sangue, lama e pústulas, as dos bares e as dos parlamentares.

Não é só a podridão alheia que ele espia, como sabem os leitores da Chiclete com Banana, a tira diária que criou para a Ilustrada. Os quadrinhos, habitados por fauna rica, mas praticamente extinta, deram origem, em 1983, à revista de humor que virou referência e influenciou uma nova geração de cartunistas.

A tira foi e continua sendo seu divã público. Quando passou a ser reconhecido e incensado, criou o Walter Ego. Que só perdeu em narcisismo para um Fernando Henrique que Angeli viu e mostrou nas centenas de charges da era FHC. "É fácil ficar com o ego nas alturas. É fina a linha que divide o prazer da visibilidade da babaquice. O Walter só existiu para resolver meu problema de ego. Temi virar babaca. Mas tive alta." A arte de Angeli incluiu a arte de zoar a si mesmo.

NÃO SOU PALHAÇO

Na sessão de fotos, reivindicou não ser feito de Didi Mocó, ou seja, não ser tratado como palhaço, à la Renato Aragão. Depois, já relaxado no estúdio-casa do edifício Bretagne, no bairro paulistano de Higienópolis, o humorista disse odiar que lhe peçam sorrisos: "O humor que faço é negro, sou carracuncudo, não sou de muita festa. Às vezes, confundem meu trabalho com o de comediante. Nem por isso me visto de palhaço."

Na mira da câmera, descontraiu-se mais quando lhe pediram pose com cigarro. Registrada a baforada, debochou da lenda: "Legal. Agora quer fazer uma com cocaína?".

O selo de "muito louco" já deu o que tinha que dar. Foi mesmo, quem não sabe? "Eu me recusei a tirar o pé da jaca por muito tempo." Até hoje, é abordado por desconhecidos que chegam íntimos e intimando: "Cara, você é o maior locão".

Não é porque colocou no mundo tipos insanos que Angeli "arrasta a língua no chão", como leu outro dia ao seu respeito, num blog.

Óbvio, a matéria-prima dos seus quadrinhos veio de coisas bem experimentadas. Mas não custa repisar que não foi na mesa de bar, e sim na prancheta, na pressão dos prazos de entrega e na esgrima com ideias nem sempre incríveis que ele garantiu o sucesso do seu pessoal: a pé na jaca Rê Bordosa, o fetichista Ed Campana, o punk Bob Cuspe, os sacanas Skrotinhos, o festivo Meiaoito e os outros menos lembrados.

Todos mortos. Se bem que a velha "junkie", sacrificada em 1987, foi vista por aí, andando e falando no YouTube, em festivais de cinema. É a estrela do premiado curta de Cesar Cabral, o "Dossiê Rê Bordosa".

"Foi por meio da Rê que parei de me drogar. Com ela percebi o quanto era inútil passar noites e noites cheirando, fumando e transando com as pessoas erradas", diz Angeli.

Mesmo depois de seu criador virar a página, essa turma dos anos 80 insiste. Os bichos-grilos Wood e Stock estão em "Sexo, Orégano e Rock'n'Roll", primeiro longa de animação com personagens nacionais que, para Angeli, "não chegou lá".

Tem criações que só funcionam no papel, defende. Vamos ver, então, o que será da Mara Tara, aquela de espartilho, meia-arrastão e chicote na mão que vai para o cinema com Christiane Tricerri. A atriz finaliza um roteiro com a ninfomaníaca.

"Fiquei cansado desses personagens. Por um tempo me aprisionei nesse caminho. Não sabia para onde ir com eles, mas não sabia como abrir mão. Arrastei um pouco."

Até o desapego. Diz que desapego é traço seu. Não possui nada, nem carro. Só agora está comprando um imóvel, para separar casa de estúdio. "Tive oportunidades antes, mas preferi investir em cocaína."

O cartunista vem fazendo experimentações tanto na página A2 quanto nos quadrinhos. "Gosto do resultado na charge, mas na tira ainda estou tateando. Curto algumas coisas, outras estão verdes."

Sua série recente da mulher descabeçada seria uma das verdes. Nem perdeu tempo em falar a respeito. "Ah, vou acabar logo com isso, não estou gostando. Mas é desejo de abordar a atitude do homem medieval, que maltrata mulher".

No papel, ele também maltrata. Prepara mais um livro baseado na sua coluna "Let's Talk about Sex", do UOL. No primeiro, "Sexo É uma Coisa Suja" (Devir, 2003), não faltam fêmeas mutiladas, siliconadas e comidas _em cenas de canibalismo mesmo. "Estou avançando no desenho erótico. Esse trabalho me dá prazer, gosto de ser maldoso."

Quando ainda era o Arnaldo, filho de outro Arnaldo, o funileiro, fazia maldades na escola. Natural: era o maior da turma, repetiu várias vezes. "Eu já tinha barbinha, estudava com os pequenos, então só me restava ficar oprimindo a molecada". Cabulava aula nos campos de várzea da Casa Verde, para brincar de guerra e imitar o astro do telerringue Ted Boy Marino. Garoto da periferia, também teve a sua fase de mexer com mulher em porta de padaria.

Parou de estudar na primeira série ginasial, depois de um colega lhe apresentar "O Pasquim", em 1969. "Foi minha tábua de salvação. Já estava mal na escola, mal com a família. Virei cartunista ali."

Fugido da escola para nunca mais voltar, Angeli viveu e aprendeu do jeito que deu. "Eu me reciclo aos trancos e solavancos. Sou autodidata." Nunca fez curso de desenho, nunca fez curso de nada. Ele lembra de dois títulos que marcaram sua adolescência: "O Lobo da Estepe", de Hermann Hesse, e "As Portas das Percepção", de Aldous Huxley. "Ali me tornei curioso."

Ampliou essa prateleira hippie ainda no início dos 70, quando alugou uma casa no Brooklin junto com amigos da Casa Verde "que tinham pretensões artísticas e intelectuais". Era um centro de artistas frequentado por gente que, informalmente, apontava o que era importante ler, ver, ouvir etc. "Recebíamos visitas que colaboraram muito com nossa formação 'intelectual' e sexual."

O grupo voltou para a Casa Verde quando a polícia passou a vigiar o "aparelho" cultural. "Mas voltamos diferentes. Com outra bagagem."

PIRANDELLO NO BANHEIRO

As deficiências em gramática, o cartunista enfrentou com a ajuda da segunda mulher e mãe de seus filhos, Márcia, que é diretora de TV. "Sempre tive agilidade para ordenar um texto, mas desfalecia a cada encontro com as regras."

Queria ler mais. Se antes traçava jornais de cabo a rabo, agora vai direto "ao que interessa". Os livros, que devorava "de uma tacada", hoje são consumidos em outro ritmo. "Pirandello fica no banheiro, para leitura matinal; `O Jogador', de Dostoiévski, vive em cima da prancheta, e vou lendo aos nacos."

"Os Reis do Iê-Ie-Iê", dos Beatles, foi um marco cinematográfico nessa longa e conhecida trajetória -que "atravessou o delírio hippie, raspou na militância e berrou no punk rock", como bem sintetizou Angeli. "Com os Beatles, dei uma entortada. Comecei a pensar em como eu queria ser, na roupa que eu queria vestir."

Hoje, Angeli se preocupa em continuar sendo o que é sem parecer "um Elvis Presley velho". Já foi menos discreto no vestir. "A idade em que estou é um perigo. Não quero estagnar, mas também não posso me vestir como um senhor de 53 anos. Nunca usei terno. Assumir minha idade com as influências que carrego é como fazer um doce sem deixar desandar. A roupa é importante para mostrar o que penso."

Ele nem se considera mais roqueiro. Um de seus dois filhos, o produtor musical Pedro, 28 (a outra é Sofia, de 22), mostrou a ele bandas novas, sons eletrônicos. Adora Franz Ferdinand e Arctic Monkeys. Mas ainda escuta muito Bob Dylan e também guarânia, calipso _o ritmo, não a banda, bem entendido.

O frescor vem dos filhos e vem também de Carol, 32, designer gráfica e arquiteta de formação, com quem está há mais de uma década. "Conheci Carol quando ainda estava sujo da poeira da noite, cheirava a banheiro de bar. Ela veio limpinha, novinha, fresquinha. "

Os dois se cruzaram no lançamento de um dos livros dele. A moça, na época com 17 anos, virou no ato a arte-finalista de Angeli. Carol diz que era fã do Bob Cuspe desde pequena. "Mas nunca fui aquele tipo fanática ardorosa, que conhece tudo do autor e tem a maior fixação."

A legião de "ardorosas com fixação" já deu mais trabalho para Angeli. Quando o chargista circulava pela noite, elas descobriam o telefone, rondavam o estúdio, faziam campana. "Eu alimentava. De um tempo pra cá passei a dar menos importância para isso". Outro dia, uma tiete comentou na internet ter visto o Angeli e atestou que ele "ainda" é boa pinta. O povo que diz.

A droga mais pesada que Angeli usa é o trabalho. Quando está de folga, diverte-se desenhando. Dos maus hábitos, ficaram os de roer unha, fumar e dormir pouco.

Sente dores na coluna. Tem bico de papagaio. "O médico diz que tenho que fazer exercício. Mas tenho preguiça." Está há um mês com um dedo dolorido, não consegue dobrar. Ainda não marcou consulta.

A médica indicou férias para ele largar o cigarro, associado ao processo criativo. "Quando breco numa ideia, acendo um e vou em frente."

Mas seu projeto é no máximo fumar menos, sem pretensões de pureza. "O mundo está ficando muito limpinho, mas ainda faço parte dele, então participo como mau exemplo. Quero que me usem como baliza."

Sobre a efemeridade das mídias



The New York Times
Umberto Eco

No encerramento da Escola para Livreiros Umberto e Elisabetta Mauri, em Veneza, falamos, entre outras coisas, sobre a efemeridade dos suportes da informação. Foram suportes da informação escrita a estela egípcia, a tábua de argila, o papiro, o pergaminho e, evidentemente, o livro impresso. Este último, até agora, demonstrou que sobrevive bem por 500 anos, mas só quando se trata de livros feitos de papel de trapos. A partir de meados do século 19 passou-se ao papel de polpa de madeira, e parece que este tem uma vida máxima de 70 anos (com efeito, basta consultar jornais ou livros dos anos 1940 para ver como muitos deles se desfazem ao ser folheados).

Portanto, há muito tempo se realizam congressos e se estudam meios diferentes para salvar todos os livros que abarrotam nossas bibliotecas: um dos que têm maior êxito (mas quase impossível de realizar para todos os livros existentes) é escanear todas as páginas e copiá-las para um suporte eletrônico.

Mas aqui surge outro problema: todos os suportes para a transmissão e conservação de informações, da foto ao filme cinematográfico, do disco à memória USB que usamos no computador, são mais perecíveis que o livro. Isso fica muito claro com alguns deles: nas velhas fitas cassete, pouco tempo depois a fita se enrolava toda, tentávamos desemaranhá-la enfiando um lápis no carretel, geralmente com resultado nulo; as fitas de vídeo perdem as cores e a definição com facilidade, e se as usarmos para estudar, rebobinando-as e avançando com frequência, danificam-se ainda mais cedo.

Tivemos tempo suficiente para ver quanto podia durar um disco de vinil sem ficar riscado demais, mas não para verificar quanto dura um CD-ROM, que, saudado como a invenção que substituiria o livro, saiu rapidamente do mercado porque podíamos acessar online os mesmos conteúdos por um custo muito menor. Não sabemos quanto vai durar um filme em DVD, sabemos somente que às vezes começa a nos dar problemas quando o vemos muito. E igualmente não tivemos tempo material para experimentar quanto poderiam durar os discos flexíveis de computador: antes de podermos descobrir foram substituídos pelos CDs, e estes pelos discos regraváveis, e estes pelos "pen drives".

Com o desaparecimento dos diversos suportes também desapareceram os computadores capazes de lê-los (creio que ninguém mais tem em casa um computador com leitor de disco flexível), e se alguém não copiou no suporte sucessivo tudo o que tinha no anterior (e assim por diante, supostamente durante toda a vida, a cada dois ou três anos), o perdeu irremediavelmente (a menos que conserve no sótão uma dúzia de computadores obsoletos, um para cada suporte desaparecido).

Portanto, sabemos que todos os suportes mecânicos, elétricos e eletrônicos são rapidamente perecíveis, ou não sabemos quanto duram e provavelmente nunca chegaremos a saber. Enfim, basta um pico de tensão, um raio no jardim ou qualquer outro acontecimento muito mais banal para desmagnetizar uma memória. Se houvesse um apagão bastante longo não poderíamos usar nenhuma memória eletrônica.

Mesmo tendo gravado em meu computador todo o "Quixote", não o poderia ler à luz de uma vela, em uma rede, em um barco, na banheira, enquanto um livro me permite fazê-lo nas piores condições. E se o computador ou o e-book caírem do quinto andar estarei matematicamente seguro de que perdi tudo, enquanto se cair um livro no máximo se desencadernará completamente.

Os suportes modernos parecem criados mais para a difusão da informação do que para sua conservação. O livro, por sua vez, foi o principal instrumento da difusão (pense no papel que desempenhou a Bíblia impressa na Reforma protestante), mas ao mesmo tempo também da conservação.

É possível que dentro de alguns séculos a única forma de ter notícias sobre o passado, quando todos os suportes eletrônicos tiverem sido desmagnetizados, continue sendo um belo incunábulo. E, dentre os livros modernos, os únicos sobreviventes serão os feitos de papel de alta qualidade, ou os feitos de papel livre de ácidos, que muitas editoras hoje oferecem.

Não sou um conservador reacionário. Em um disco rígido portátil de 250 gigabytes gravei as maiores obras-primas da literatura universal e da história da filosofia: é muito mais cômodo encontrar no disco rígido em poucos segundos uma frase de Dante ou da "Summa Theologica" do que levantar-se e ir buscar um volume pesado em estantes muito altas. Mas estou feliz porque esses livros continuam em minha biblioteca, uma garantia da memória para quando os instrumentos eletrônicos entrarem em pane.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Umberto Eco

Umberto Eco

Umberto Eco é professor de semiótica, crítico literário e romancista. Entre seus principais livros estão "O Nome da Rosa" e o "Pêndulo de Foucault".





Mostra reúne filmes com estética trash e produção quase caseira, à margem do mercado e do circuito tradicional


Cinema de Bordas
quarta 22 a domingo 26 de abril de 2009


quarta 22
20h abertura da mostra,
conversa com os curadores Bernadette Lyra e Gelson Santana
e exibição dos filmes Horror Capiau e A Dama da Lagoa
21h coquetel


quinta 23
17h exibição dos filmes Insector Sun: O Guardião da Terra/A Hora da Verdade, Cocô Preto e Era dos Mortos
20h exibição dos filmes O Assassinato da Mulher Mental e A Capital dos Mortos


sexta 24
17h exibição dos filmes O Soco Silencioso e Rambú IV: O Clone
20h exibição dos filmes Aventuras de Um Caçador e Um Rico Pobre

sábado 25
17h exibição do filme A Valise Foi Trocada
20h exibição dos filmes Desaparecidos e Zombio

domingo 26
17h exibição dos filmes O Farol e Patrícia Gennice
20h exibição do filme Mangue Negro

A classificação etária de todos os filmes é de 14 anos, exceto Mangue Negro e Zombio [16 anos]

entrada franca - ingresso distribuído com meia hora de antecedência

Itaú Cultural - Sala Itaú Cultural | Avenida Paulista 149 - Paraíso - São Paulo SP [próximo à estação Brigadeiro do metrô]
informações 11 2168 1777

Era dos Mortos, Rambú IV: O Clone, Zombio e Cocô Preto são algumas produções da mostra Cinema de Bordas, realizada pelo Itaú Cultural com curadoria de Bernadette Lyra e Gelson Santana, entre os dias 22 e 26 de abril. Com estética trash e produção quase caseira, esses vídeos são realizados à margem do cinema comercial ou mesmo do cinema que pretende ter o status de arte.

Cunhado pela pesquisadora Bernadette Lyra, o termo "cinema de bordas" se aplica à vasta produção cinematográfica realizada em todo o Brasil por produtores independentes que, apesar do baixo orçamento, suspendem os limites entre o sofisticado e o popular. Histórias inusitadas e narrativas marcadas pela ação e o sentimento são a base dessas realizações, que, aproveitando-se dos poucos recursos, sugerem uma linguagem diferente entre as muitas já apropriadas pelo cinema.

Cinema de Bordas reúne em uma só mostra diversos títulos dessa safra, e você não pode perder. Confira a programação completa ao lado e a sinopse dos trabalhos e surpreenda-se. Compareça!

Leia aqui o texto dos curadores Bernadette Lyra e Gelson Santana
http://www.itaucultural.org.br/programacao/box_cinema_bordas_curador.htm